Monday, November 10, 2025

Nada Bindu Upanishad - português

 

Georgia O’Keeffe, Sem título - Abstração com círculo azul e linha, 1976-1977

Este é um Upanishad da categoria dos Yoga Upanishads e tem como objeto o estado meditativo profundo através da concentração no Nada, o som cósmico. Este manuscrito é rico em informações para investigar a natureza da sílaba Om, além de ajudar a compreender o Bindu (literalmente “ponto” em sânscrito), o ponto de onde surge toda a criação, símbolo da origem e dissolução de todo o mundo manifestado. Assim sendo, a meditação deve começar pelo bindu: o aspirante se concentra em um ponto (como o ponto entre as sobrancelhas) para adentrar na meditação repetindo Om.

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º º º

Om!

Que minha fala esteja de acordo com a mente;

Que minha mente esteja de acordo com a fala.

Ó, Tu, o autorrefulgente, revele-Se a mim.

Que ambos (mente e fala) sejam os portadores dos Vedas para mim.

Que nada do que já ouvi se separe de mim.

Eliminarei a diferença entre dia e noite através deste estudo.

Falarei o que é verbalmente verdadeiro.

Falarei o que é mentalmente verdadeiro.

Que Brahman me proteja,

Que Brahman proteja o Guru, que Ele me proteja.

Que Brahman proteja o Guru, que Ele proteja o Guru.

Om,

Que haja paz em mim.

Que haja paz em meu ambiente.

Que haja paz nas forças que agem sobre mim.


[Um dos contextos dados à introdução deste Upanishad é que ela se refere ao Vairaja Pranava, uma versão específica do mantra Om. Este Vairaja é tido como o “rei dos pássaros”.]


1. A letra A é considerada a asa direita do pássaro (o Om, Aum); a letra U a asa esquerda; a letra M é sua cauda; o ardha-matra* é conhecido como sua cabeça.


* [O ardha-matra é o quarto “som” após as três letras que formam o Om, “Aum”, e representa um som sutil, não pronunciado. As três letras em Om, que podem ser manifestadas através da fala, representam o mundo material (a manifestação), e o ardha-matra, um não-som (que é diferente do silêncio), já que não pode ser pronunciado, representa o sem-qualidades, o Absoluto.]


2. Os atributos [gunas] de rajas [paixão] e tamas [ignorância] vão de seus [o pássaro] pés para cima até os quadris; sattva [bondade] é o corpo; o dharma é considerado seu olho direito e o adharma o esquerdo.


3. Bhurloka [plano terreno] está situado em seus pés; Bhuvarloka [plano intermediário] em seus joelhos; Suvarloka [plano celestial inicial] em seus quadris e Maharloka [plano celestial intermediário] em seu umbigo. 


4. Em seu coração está situado Janoloka [plano espiritual dos sábios]; Tapoloka [plano espiritual dos praticantes de austeridades] em sua garganta e Satyaloka [a morada de Brahma, o criador] no centro da testa, entre as sobrancelhas.


5 (a). O matra [letra], ou mantra, além de sahasrara (o chakra com mil raios) é explicado a seguir.


5(b)-6(a). Um adepto da yoga que cavalga no hamsa (o cisne) e que contempla o Om não é nem afetado pelas influências cármicas, nem por dez crores de pecados. 


6(b)-7. O primeiro matra [a primeira letra e primeiro som em Om, “a”] tem Agni (fogo) como a deidade que preside (Devata); o segundo matra [a segunda letra e segundo som em Om, “u”] tem Vayu (vento) como Devata; o matra seguinte [a terceira letra e terceiro som em Om, “m”] é luminoso como a esfera do sol e, por último, o ardha-matra, que o sábio reconhece como sendo Varuna, a deidade que preside a água. 


8. Cada um desses matras é composto de três partes (kalas). A isso chamamos de Omkara. Conheça-o através de dharana, ou seja, da concentração em cada uma das doze partes (as variações dos matras produzidas pela diferença de svaras [notas musicais] ou da entonação).


9-11. O primeiro matra é chamado Ghoshini; o segundo, Vidyunmali (ou Vidyunmatra); o terceiro, Patangini; o quarto, Vayuvegini; o quinto, Namadheya; o sexto, Aindri; o sétimo, Vaishnavi; o oitavo, Sankari; o nono, Mahati; o décimo, Dhriti (Dhruva); o décimo primeiro, Nari (Mauni); e o décimo segundo, Brahmi.


12. Se uma pessoa vem a falecer no primeiro matra, quer dizer, enquanto o contempla, renascerá como um grande governante em Bharatavarsha [a Índia].


13. Se falece no segundo matra, ela se torna um ilustre yaksha [ser da natureza]; se falece no terceiro matra, torna-se um vidyadhara [semideus]; se no quarto matra, um gandharva [ser celestial]. Estas três categorias são os anfitriões celestiais. 


14. Caso faleça no quinto matra, o ardha-matra, a pessoa viverá no plano da lua, na posição de um Deva (um ser iluminado), que é altamente glorificado naquela região.


15. Se no sexto matra, a pessoa se fundirá a Indra [chefe dos deuses]; se no sétimo, ela chegará à morada de Vishnu; se no oitavo, encontrará Rudra, o Senhor de todas as criaturas. 


16. Se no nono, chegará a Maharloka; se no décimo, em Janoloka; se no décimo primeiro, em Tapoloka; e se no décimo segundo, ela obtém o estado eterno de Brahma. 


17. Aquilo que está além de todos esses estágios, Parabrahman, que está além dos matras citados, o puro, onipresente, além das partes, sempre refulgente e a fonte de todas as luzes (jyoti, luz espiritual), precisa ser conhecido. 


18. Quando a mente for capaz de superar os órgãos e os gunas (atributos da natureza material) e ficar absorta, sem ter existência separada [do Todo] e sem qualquer ação mental, então o Guru deve instruir para um desenvolvimento mais profundo.


19. Aquele que se dedica a contemplar o Todo e está sempre absorto Nele, deve gradualmente deixar a família, seguindo o caminho da Yoga e evitar qualquer relação com a sociedade.


20. Então ele, estando livre dos laços do karma e da existência como Jiva [entidade encarnada], e por ser puro, desfruta de suprema bem-aventurança ao atingir o estado de Brahman. 


21. Ó sábio, passe sua vida sempre em conhecimento da bem-aventurança suprema, desfrutando de todo o seu prarabdha karma [a porção do karma que está sendo desfrutada na vida atual, como por exemplo o contexto doméstico e o corpo], sem fazer quaisquer reclamação. 


22-23(a). Mesmo após Atma-Jnana (conhecimento do Atma, ou do Eu) ter despertado em alguém, o prarabdha não o deixa. Porém, prarabdha não é sentido após a chegada de Tattva-Jnana (conhecimento de Tattva, ou a verdade) porque o corpo e as outras coisas são asat (irreais), assim como aquilo que é visto em sonho para quem acorda. 


23(b)-24. Aquela porção do karma produzida em nascimentos anteriores, e que é chamada de prarabdha, não afeta em nada o Tattva-Jnani [aquele que possui Tattva-Jnana], uma vez que não haverá renascimento para ele. Assim como o corpo que existe no estado de sonho não é verdadeiro, este corpo material também não é.


25(a). Onde está então o renascimento para algo que é ilusório? Como pode algo ter uma existência quando não há nascimento para ele?


25(b)-26(a). Da mesma maneira como o barro é a causa material do jarro, aprende-se com a Vedanta que Ajnana [ignorância] é a causa material do universo e quando ela deixa de existir, onde então estaria o cosmos?


26(b)-27. Assim como uma pessoa que pela ilusão confunde uma corda com uma cobra, o tolo, desconhecendo satya (a verdade eterna) enxerga o mundo como verdadeiro. Quando ele reconhece que era apenas uma corda, a ideia ilusória da cobra se desfaz.


28-29(a). Quando se conhece o substrato eterno de tudo, e todo o universo se torna vazio, o que é então prarabdha para ele, cujo corpo é parte do mundo? Portanto, a palavra prarabdha é aceita para iluminar o ignorante. 


29(b)-30. Quando o prarabdha, no devido tempo, esgota, aquele que é o som resultante da união de Pranava com Brahman, que é a própria refulgência absoluta e concessor de bondade, faz brilhar a si mesmo quando há a dispersão das nuvens [quando cessa a ignorância]. 


31. O iogue na postura de siddhasana, praticando o Vaishnavi-Mudra, deve sempre ouvir o som interno pelo ouvido direito.


32. O som produzido o deixa surdo a todos os sons externos. Ao ter superado todos os obstáculos, ele adentra o estado de Turiya [situado no ardha-matra de Om] em quinze dias.


33. No início de sua prática, ele ouve muitos sons altos. Eles aumentam gradualmente em tom e são ouvidos cada vez mais sutilmente.


34. A princípio, os sons se parecem com os dos oceanos, das nuvens, de tímpanos [o instrumento musical] e das cataratas. No estágio intermediário, os sons se parecem com a mardala [um instrumento musical de percussão típico da região de Odisha], sinos e buzinas. 


35. No estágio final, os sons se parecem com sinos tilintantes, flauta, vina [instrumento de cordas tido como divino e sagrado] e abelhas. Assim, ele ouve diversas sutilezas.


36. Quando este estágio é alcançado, quando o som do grande tímpano está sendo ouvido, deve-se tentar distinguir apenas os sons cada vez mais sutis.


37. Ele pode mudar sua concentração do som grosseiro para o sutil, ou do sutil para o grosseiro, mas não deve permitir que sua mente desvie desses sons para outros.


38. A mente, tendo inicialmente se concentrado em um dos dois sons, fixa-se firmemente e é absorvida por eles.


39. Ao se tornar insensível às impressões externas, a mente se torna uma com o som, assim como o leite com a água, e depois, rapidamente, se absorve em Chidakasha [o assento da consciência suprema; o akasha (espaço) onde chit (consciência) prevalece].


40. Sendo indiferente aos objetos, o iogue que controla suas paixões, deve, pela prática contínua, concentrar sua atenção no som que aniquila a mente.


41. Ao abandonar todos os pensamentos e livrando-se de todas as ações, deve-se sempre concentrar a atenção no som e então, chitta [a mente] se absorve ao som.


42-43(a). Assim como a abelha que bebe o mel não se importa com o odor dos arredores, chitta, que está sempre absorta no som, não deseja os objetos sensoriais, uma vez que está inebriada pela doce fragrância de Nada e abandonou sua natureza fugaz [a mortalidade]. 


43(b)-44(a). A serpente de chitta, ao ouvir o som Nada, fica totalmente absorta e, ao ficar inconsciente de tudo, concentra-se apenas naquele som.


44(b)-45(a). Este som serve ao propósito de controlar o elefante enlouquecido, chitta, que vagueia pelos jardins dos prazeres que são os objetos sensórios.


45(b)-46(a). Este som serve como uma armadilha para prender os veados - chitta - que também serve como margem para as ondas do oceano mental. 


46(b)-47(a). O som que provém do Pranava [o Om], que é o próprio Brahman, é da natureza da refulgência; a mente se absorve em tal refulgência, onde situa-se a sede suprema de Vishnu.  


47(b)-48(a). O som existe até onde vai a concepção akáshica (Akasha Sankalpa) [concepção espacial]. Para além dela, há o Parabrahman sem som, que é o Paramatma. 


48(b). A mente existe enquanto houver som, mas com a cessação dele, surge o estado da mente chamado Unmani, o estado de existir além da própria mente. 


49(a). Este som está absorto em Akshara (indestrutível) [a sílaba imutável], e o estado sem som é a morada suprema. 


49(b)-50(a). A mente que, junto do prana (vayu, o vento), tem suas afinidades cármicas destruídas devido à concentração constante em Nada, fica absorta no Um imaculado. Não há dúvidas sobre isso.


50(b)-51(a). Muitas miríades de Nadas e muitas mais de Bindus, tudo se absorve no som de Brahma Pranava [o Om (Pranava) do criador (Brahma), ou o “som criador”, uma vez que acredita-se que o mundo manifesto tenha surgido a partir do som].


51(b)-52(a). Livrando-se de todos os estados e de todos os pensamentos, o iogue mantém-se como um morto. Ele é mukta [a liberação]. Não há dúvidas sobre isso.


52(b). Após isso, ele não ouve os sons da concha ou do dundubhi (um tímpano grande).


53. O corpo no estado de Unmani é como uma tora de madeira e não sente calor ou frio, alegria ou tristeza.


54. O chitta do iogue, ao abandonar a fama e a desgraça, está em Samadhi, acima dos três estados.


55. Libertando-se dos estados de vigília e sono [e sono profundo], atinge-se o estado verdadeiro [turiya].


56. Quando a visão espiritual se fixa sem o apoio de nenhum objeto à vista, quando vayu (o prana, a energia vital) permanece parado sem qualquer esforço, e quando chitta fica firme sem nenhum suporte, atinge-se a forma do som interno do Brahma Pranana. Assim é este Upanishad.


Om!

Que minha fala esteja de acordo com a mente;

Que minha mente esteja de acordo com a fala.

Ó, Tu, o autorrefulgente, revele-Se a mim.

Que ambos (mente e fala) sejam os portadores dos Vedas para mim.

Que nada do que já ouvi se separe de mim.

Eliminarei a diferença entre dia e noite através deste estudo.

Falarei o que é verbalmente verdadeiro.

Falarei o que é mentalmente verdadeiro.

Que Brahman me proteja,

Que Brahman proteja o Guru, que Ele me proteja.

Que Brahman proteja o Guru, que Ele proteja o Guru.

Om,

Que haja paz em mim.

Que haja paz em meu ambiente.

Que haja paz nas forças que agem sobre mim.


Aqui termina o Nada Bindu Upanishad, como contido no Rig Veda


 º º º

Traduzido para o inglês por K. Narayanaswami Aiyar

Traduzido para o português por Mariângela Carvalho

[N. do T.: As informações em colchetes são adendos do tradutor.]

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